Pelicanos de Balandrau.

"Que cada um se esforce individualmente e de acordo com as possibilidades de sua inteligência; mas que cuide de não censurar os demais, seja porque ele não os entende ou porque eles não o entendem, já que sempre ocorre um dos casos, e freqüentemente ambos de uma só vez. Toda opinião sincera merece por tal razão ser respeitada, ainda que possa haver discordância em seus méritos. A verdadeira liberdade de pensamento mede-se pela liberdade que cada indivíduo sabe conceder aos demais" PEDRO DONIDA

sábado, 22 de agosto de 2009

Anúbis



Qual estrela reinventado a imanência da sua luz no cosmos da imortalidade, onde a mítica constelação da vida se traduzia e renovava num fulgor eterno, Anúbis (Anupu em egípcio) iluminava a noite do panteão egípcio enquanto pilar que sustinha o templo de um mito intemporal que prometia às almas a eternidade.

Escravizados pelo alento de vogarem no regaço da imortalidade, superando os próprios limites da existência, os Egípcios conceberam a arte do embalsamamento, que, ao conservar os seus corpos, os arrebatava ao abominável espectro da deterioração, tal como sugere uma das muitas inscrições talhadas sobre os caixões: “Eu não deteriorarei. O meu corpo não será presa dos vermes, pois ele é durável e não será aniquilado no país da eternidade”. Esta arte divina, apta a enfeitiçar o tempo, tornando-o escravo daqueles que a ela recorriam, era ditada, reinventada e abençoada por Anúbis, guardião das sublimes moradas da eternidade, Soberano das mumificações e embalsamamentos, intermediário entre o defunto e o tribunal que o aguardava no Além e deidade cuja aparência é estigmatizada pelas incumbências de que é investido. Por conseguinte, e numa flagrante evocação dos cães e chacais que velavam pelas inóspitas e desérticas necrópoles, esta divindade surge como um animal da família dos Canídeos ou, então, como um homem detentor de uma cabeça de chacal. A mitologia egípcia revela-nos que Anúbis era fruto de uma ilegítima noite de amor vivida por Osíris nos braços de Néftis.

A lenda revela-nos que tão inusitada união dera-se aquando do retorno do então Soberano do Egipto ao seu magnífico país. Extenuando de uma viagem que o mantivera longe da sua pátria por uma eternidade, Osíris ardia em desejo de sentir o Sol que raiava no olhar de Ísis despir a mortalha de nuvens, tecida pela saudade, que vestia e sufocava os céus de sua alma. Ao vislumbrar Néftis, o deus enlaça-a então em seus braços, tomando-a pela sua esposa. E os seus sentidos, cegos pela paixão, revelam-se impotentes para lhe desvendar a traição que ele cometia, antes desta encontrar-se consumada. Graças a uma coroa de meliloto abandonada por Osíris no leito de Néftis, Ísis abraça a percepção de que o seu amado esposo havia-lhe sido infiel e, desesperada, confronta a sua irmã, que lhe revela que de tão ilídimas núpcias nascera um filho, Anúbis, o qual, temendo a cólera do seu esposo legítimo, Seth, ela havia ocultado algures nos pântanos. Ísis, a quem não fora concedido o apanágio de conceber um filho de Osíris, enleia então a resolução de resgatá-lo ao seu esconderijo, percorrendo assim todo o país até encontrar a criança. Acto contínuo, e numa notória demonstração da benevolência que lhe era característica, a deusa amamenta Anúbis, criando-o para tornar-se o seu protector e mais fiel companheiro.

A lenda de Osíris comprova que Ísis foi coroada de sucesso, uma vez que, após o desmembramento do corpo de seu esposo, Anúbis voluntariou-se prontamente para auxiliar a deusa a reunir os inúmeros fragmentos do defunto. Posteriormente, Anúbis participa com igual dedicação nos rituais executados com o fim de restituir a Osíris o sopro de vida e que lhe facultaram a concepção da primeira múmia, facto que legitimou a sua conversão no venerado deus do embalsamamento, eterno guia do defunto no Além. A sua crescente influência garantiu-lhe um posto relevante no tribunal composto por quarenta e dois juizes que julgava os recém- inumados. De facto, é ele quem conduz o morto até Osíris, apresentando-o ao tribunal por ele presidido, para de seguida proceder à pesagem do coração. Se porventura o morto desejar mais tarde regressar à terra, é Anúbis quem ele tem a obrigação de notificar previamente, dado que esta surtida só será exequível com o seu consentimento expresso, formalmente consignado sob a forma de um decreto.

As suas múltiplas funções permitem a este deus deter diversas denominações, embora todas elas se encontrem intrincadamente relacionadas com o seu papel na vida póstuma dos egípcios. Assim, Anúbis é reconhecido como “o das ligaduras”, como patrono dos embalsamadores, “presidente do pavilhão divino”, enquanto soberano do edifício onde a poesia da mumificação era declamada por peritos, “senhor da necrópole” ou então “aquele que está em cima da montanha”, designações que exaltavam a sua posição enquanto guardião dos túmulos e condutor dos defuntos nos traiçoeiros labirintos do mundo inferior. Como tal, não é de todo inusitado o rol interminável de hinos e preces a ele destinados, que encontramos não raras vezes nas paredes das mastabas mais antigas e igualmente no famigerado “Texto das Pirâmides”.

Anúbis constitui igualmente a deidade tutelar da décima sétima província do Alto Egipto, cuja capital, Cinopólis (“A Cidade dos Cães”), era o âmago do seu culto, não obstante a sua imagem ser também uma constante em relevos e textos figurativos existentes nas sepulturas reais ou plebeias do vale do Nilo. Com efeito, ao longo de toda a época faraónica, Anúbis usufruiu de uma inefável popularidade que se reflectiu na sólida implantação do seu culto nos díspares centros religiosos do país, particularmente em Tebas ou Mênfis. Em Charuna, localidade próxima do seu principal santuário, deparamo-nos com uma necrópole de cães mumificados, os quais eram venerados enquanto animais sagrados do deus.

Mas afinal que arte era esta que Anúbis protegia e representava? Originalmente, antes de haverem alcançado o seu meticuloso método de mumificação, os Egípcios envolviam os seus defuntos numa esteira ou pele de animal, visando que o calor e o vento dissecassem os cadáveres. Após um moroso processo evolutivo, os embalsamadores conseguiram enfim obter de forma artificial tal conservação natural, mediante um prolixo tratamento, que se prolongava por setenta dias. Uma vez ser necessário quantidades abundantes de água para lavrar os corpos, este ritual era realizado na margem Ocidental do rio Nilo (a considerável distância das habitações), onde os embalsamadores trabalhavam numa tenda arejada. Ultimado o referido período de tempo, os defuntos seguiam para as designadas “Casas de Purificação”, meras salas reservadas para as práticas de mumificação, onde cada gesto dos embalsamadores era talhado no olhar vigilante dos sacerdotes. Segundo inúmeros baixos-relevos e pinturas, estes primeiros ostentavam máscaras com a efígie do deus- chacal Anúbis, a deidade protectora dos mortos, talvez num desejo de atrair a sua benevolência.

O único exemplar que se conserva de semelhante máscara leva a crêr que esta servisse igualmente de protecção contra os diversos cheiros que fustigavam os embalsamadores. Alguns momentâneos descuidos destes levaram-nos a esquecerem-se, por vezes, de determinados instrumentos no interior das múmias, o que nos permite conhecer, aprofundadamente, os seus diversos utensílios de trabalho: ganchos de cobre, pinças, espátulas, colheres, agulhas, vasos munidos de bicos para deitar a goma escaldante sobre o cadáver e furadores com cabeça de forcado, para abrir, esvaziar e tornar a fechar o corpo. Dada a ausência de qualquer informação legada pelos Egípcios sobre as suas técnicas de embalsamamento, é necessário recorrer aos relatos de historiadores gregos, como Heródoto, para que a nossa curiosidade seja saciada. As suas descrições permitem-nos vislumbrar cada movimento dos embalsamadores. Em primeiro lugar, estes extraíam o cérebro do defunto pelas narinas, com o auxílio de um gancho de ferro. Seguidamente, “com uma faca de pedra da Etiópia” (segundo refere Hérodoto) efectuavam uma incisão no flanco do defunto, pelo qual retiravam os intestinos do morto.

Após terem limpo diligentemente a cavidade abdominal, lavavam-na com vinho de palma e preenchiam o ventre com uma fusão de mirra pura, canela e outras matérias odoríferas. Deixavam então o corpo repousar numa solução alcalina, baseada em cristais de natrão seco, onde permanecia durante setenta dias, ao fim dos quais a múmia era envolvida com mais de vinte camadas de ligaduras e coberta por um óleo de embalsamamento (uma mistura de óleos vegetais e de resinas aromáticas- coníferas do Líbano, incenso e mirra), que endurecia, rapidamente. Todavia, as suas propriedades anti-micósicas e anti-bacterianas não protegiam a estrutura do corpo esvaziado, dessecado e leve, facto comprovado pelo incidente ocorrido com a múmia do jovem faraó Tutankhámon, que se fragmentou, quando a tentaram remover do seu caixão. As faixas que envolviam o defunto eram, preferencialmente, de cores vermelho e rosa, jamais sendo utilizado para a sua concepção linho novo, mas sim, aquele que era obtido a partir das vestes que o morto envergava em vida. À medida que as ligaduras eram colocadas em torno dos defuntos, os sacerdotes presentes pronunciavam fórmulas sagradas. Simultaneamente, depositavam-se nos leitos de linho inúmeros amuletos profilácticos, tendo mesmo sido encontrada uma múmia com cerca de oitenta e sete destes objectos de culto. Entre estes encontrava-se ankh (vida), uma das mais preciosas dádivas oferecidas aos homens pelos deuses; o olho de oudjat, ou olho de Hórus, símbolo de integridade, que selava a incisão feita pelos embalsamadores, para retirar as entranhas do morto; um amuleto em forma de coração, concebido para assegurar que os defuntos seriam bem sucedidos nos seus julgamentos; e o escaravelho, esculpido em pedra, barro ou vidro. Este insecto enrola bolas de esterco, onde depõe os ovos. Os Egípcios creiam que um escaravelho gigante gerara o Sol de forma similar, rolando-o em direcção do horizonte, até ao firmamento. Uma vez que todas as manhãs este astro soberano desprende-se de um abraço de trevas, o escaravelho tornou-se num símbolo da ressurreição dos mortos.

No exórdio da civilização egípcia, ultimados os seus processos de mumificação, as pessoas notáveis eram inumadas num caixão de forma rectangular, depositado num sarcófago de pedra, considerado como depositário das vida. Porém, ao longo da história, os caixões sofrem diversas metamorfoses, que alteraram, radicalmente, os seus simulacros. No Médio Império, os caixões tornaram-se antropomórficos, aumentando a sua produção. A própria múmia principiou a ter uma máscara de linho estucado, isenta de qualquer semelhança com o defunto. Na realidade, inúmeras múmias eram sepultadas em diversas urnas, sendo colocada uma dentro da outra, à semelhança das bonecas russas. Deste modo, a urna interna, mais ajustada, deveria encontrar-se apertada atrás. Durante muito tempo, os sarcófagos eram construídos em madeira. Não obstante, num período mais tardio, as urnas interiores eram efectuadas com camadas de papiro ou linho, o que se tornava mais economicamente acessível. Junto aos túmulos, repousavam cofres de madeira, que guardavam quatro recipientes, desde o mais humilde pote de barro ao mais faustoso vaso de alabastro. Estes canopes, cujo nome advém de Kanops, cidade situada a leste de Alexandria, continham as vísceras do defunto, uma vez que sem estas, o corpo não se encontraria completo. Inicialmente, esta pratica consistia em mais uma prerrogativa reservada aos soberanos do Egipto, mas com alguma rapidez estendeu-se igualmente aos sacerdotes e altos funcionários e, por fim, no Novo Império, a todos os egípcios abastados.

O fígado, o estômago, os pulmões e os intestinos eram envolvidos separadamente em tecidos de linho, formando embrulhos que eram, em seguida, depositados no interior dos díspares canopes, após terem sido impregnados com resina de embalsamamento. Em contrapartida, o coração, símbolo da razão, cerne do encontro do espírito e simulacro da alma, após ser submetido a um rigoroso tratamento que visava a sua conservação, era sempre recolocado no corpo do defunto, que iria necessitar dele, ao longo do seu julgamento no Além. Por seu turno, as intrínsecas vísceras eram entregues a quatro deidades protectoras, filhos de Hórus, cujas cabeças ornamentavam frequentemente as tampas dos canopes: Amset, com cabeça de homem, (cujo nome resulta de aneth, uma planta conhecida pelas suas propriedades de conservação), tornado protector do estômago; Hápi, possuidor de uma cabeça de babuíno, que vela pelos intestinos; Duamoutef, que ostenta uma cabeça de cão e cuja missão é proteger os pulmões; e Quebekhsenouf, detentor de uma cabeça de falcão, que preserva o fígado. A partir do Novo Império, eram representadas nas arestas dos canopes deusas protectoras, que, com as asas abertas, resguardavam os seus conteúdos. As mesmas deusas surgiam ajoelhadas nos cantos dos sarcófagos. Nut, a deusa da abóbada celeste, adorna a face interior do tampo do caixão.

Paradoxalmente, os mais humildes eram privados de qualquer prerrogativa, sendo sepultados no deserto, envoltos numa pele de vaca, uma vez que não possuíam meios para pagar o avultado preço da imortalidade.



Detalhes e vocabulário egípcio:
Djed- eternidade;
Keres- caixão;
Na Época Greco-Romana, Anúbis foi investido de novas incumbências, incarnando numa deidade cósmica, regente dos céus e da terra.
Etimologicamente, o epíteto “Anupus” pode possuir a sua origem na palavra inep, empregue com o significado de “putrificar”.
A imagem de Anúbis, nas suas díspares representações, é uma constante não apenas nas múmias e sarcófagos, mas também nas vinhetas dos papiros funerários. A estatueta de Anúbis com cabeça de cão selvagem constituía igualmente um amuleto, que colocava os defuntos sobre a protecção do deus. Evoca-se como exemplo o túmulo do jovem Tutankhámon, entre muitos outros.
A famigerada múmia do faraó Ramsés III sobreviveu indemne durante quase 3000 anos, graças à arte egípcia do embalsamamento e à preservação do deserto. Porém, alguns meses de permanência num museu teriam causado a sua total destruição, caso inúmeros egiptólogos não houvessem agido, prontamente.
out- embalsamadores
vabet- lugar de purificação, 'Casa da Purificação'

Isis.



Nenhuma personalidade do panteão egípcio pode rivalizar com a deusa Ísis, sublime essência da alma de uma das mais excelsas e proeminentes civilizações da antiguidade e maga detentora do esplendor ofuscante que a conduziu até ao auge da popularidade. Surgindo na teologia heliopolitana como fruto dos amores entre o céu (Nut) e a terra (Geb), Ísis reinara com uma sabedoria incontestável nas Duas Terras, o Alto e o baixo Egipto, muito antes do nascimento das dinastias. O amor que unia Ísis a Osíris em ternos esponsais vestia a sua alma com uma felicidade que abraçava o Infinito. Todavia, em breve a doce melodia que tão mítica perfeição dedilhava na harpa da sua vida seria, pelas trevas, resumida a um rol de acordes dissonantes, orquestrados numa sinfonia de silêncio e dor.

Tão vil prelúdio de uma noite sem fim surgiu sob a forma de um convite de Seth, que solicitava afavelmente a presença de seu irmão Osíris num banquete. Sem jamais cogitar que se tratava de uma ímpia conjuração, Osíris não declinou a oferta, colocando-se então à mercê de um execrável assassino. Algures no decorrer do banquete, Seth apresentou um caixão de proporções verdadeiramente excepcionais, assegurando que recompensaria generosamente aquele que nele coubesse. Imprudente, Osíris aceitou prontamente o desafio, permitindo que Seth e os seus acólitos pregassem a tampa e consequentemente o tornassem escravo da morte. Cometido o hediondo crime, o assassino Seth, que cobiçava ocupar o trono de seu irmão, lança a urna ao Nilo, para que o rio a conduzisse até ao mar, onde veio a perder-se. Este trágico incidente deu-se no décimo sétimo dia do mês Athyr, quando o Sol se encontra sob o signo de Escorpião. Quando Ísis tomou conhecimento do ocorrido, baniu de sua alma todo o desespero que a assombrava e abraçou a resolução de procurar o seu marido, a fim de lhe restituir o sopro da vida. Assim, cortou uma madeixa do seu cabelo, estigma da sua desolação, colocou o seu vestuário matutino e errou por todo o Egipto, na ânsia de ver a sua diligência coroada de êxito.

Por seu turno, e após haver dançado nas ondas do mar, a urna atingiu finalmente uma praia, perto da Babilónia, na costa do Líbano, enlaçando-se nas raízes de um jovem tamarindo, cujo prolixo crescimento a prendeu no interior do seu tronco. Ao alcançar o clímax da sua beleza, a imponente árvore atraiu a atenção do rei desse país, persuadindo-o a ordenar ao seu séquito que o tamarindo fosse derrubado, com o fito de ser utilizado como pilar na sua casa. Em simultâneo com o crescimento da referida árvore, Ísis prosseguia tão exaustivas busca pelo cadáver de seu marido, pelo que, ao escutar as histórias tecidas em torno da surpreendente árvore, tomou de imediato a resolução de ir à Babilónia, na esperança de ultimar enfim e com sucesso a sua odisseia. Ao chegar ao seu destino, Ísis sentou-se perto de um poço, ostentando um disfarce humilde e brindou os transeuntes que por ela passavam com um rosto lavado em lágrimas. Os relatos da sua inusitada condição rapidamente chegaram aos reis da Babilónia, que, intrigados, propuseram-se a conhecer o motivo de tanto desespero. Quando Ísis os viu estancar defronte de si, presenteou-os com saudações cordiais, reverentes e, solicitou-lhes que permitissem que os seus cabelos ela entrançasse. Uma vez que os regentes, embora servos da perplexidade, não impuseram qualquer veto ao seu convite, Ísis uniu o gesto à palavra, incensado as tranças que talhava pouco a pouco com o divino perfume exalado por seu ástreo corpo. Ultimado tão peculiar ritual, a rainha da Babilónia apressou-se a contemplar o resultado final, sendo enfeitiçada pelo irresistível aroma que seus cabelos emanavam. Literalmente inebriada por tão doce perfume dos céus, a rainha ordenou então a Ísis que a acompanhasse até ao palácio.

Assim, a deusa franqueou a entrada do palácio do rei da Babilónia, junto do qual conquistou o privilégio de tornar-se na ama do filho recém-nascido do casal régio, a quem amamentava com o seu dedo. Devido aos laços que a vinculavam à criança, Ísis desejou conceder-lhe a imortalidade, pelo que, todas as noites, a queimou, num fogo divino e, como tal, indolor, para que as suas partes mortais ardessem no esquecimento. Certa noite, durante este processo, ela tomou a forma de uma andorinha, a fim de cantar as suas lamentações. Maravilhada, a rainha seguiu a melopeia que escutava, entrando no quarto do filho, onde se deparou com um ritual aparentemente hediondo. De forma a tranquilizá-la, Ísis revelou-lhe a sua verdadeira identidade, e ultimou precocemente o ritual, mesmo sabendo que dessa forma estaria a privar o pequeno príncipe da imortalidade que tanto desejava oferecer-lhe. Observando que a rainha a contemplava, siderada, Ísis aventurou-se a confidenciar-lhe o lancinante incidente que a coagira a visitar a Babilónia, conquistando assim a confiança e benevolência da rainha, que prontamente aquiesceu em ceder-lhe a urna que continha os restos mortais de seu marido. Dominada por uma intensa felicidade, Ísis apressou-se a retirá-la do interior do pilar. Porém, fê-lo com tão negligente brusquidão, que os seus escombros de pedra espalharam-se por toda a divisão, atingindo, mortalmente, o pequeno príncipe. Na realidade, existem inúmeras versões deste fragmento da lenda, uma das quais afirma que a rainha expulsou Ísis, ao vislumbrar o aterrador ritual, pelo que esta retirou a urna, sem o consentimento dos seus donos. Porém, a veracidade desta versão semelha-se deveras suspicaz...

Com a urna em seu poder, Ísis regressou ao Egipto, onde a abriu, ocultando-a, seguidamente, nas margens do Delta. Numa noite, quando Ísis a deixou sem vigilância, Seth descobriu-a e apoderou-se, uma vez mais dela, com o intento de retirar do seu interior o corpo do irmão e cortá-lo em 14 pedaços, que foram, em seguida, arremessados ao Nilo. Ao tomar conhecimento do ocorrido, Ísis reuniu-se com a sua irmã Néftis, que não também tolerava a conduta de Seth, embora este fosse seu marido, e, juntas, recuperaram todos os fragmentos do cadáver de Osíris, à excepção, segundo refere Plutarco, escritor grego, do seu sexo, que fora comido por um peixe. Novamente deparamo-nos com alguma controvérsia, uma vez que outras fontes egípcias afirmam que todo o corpo foi recuperado. Acto contínuo, Ísis organizou uma vigília fúnebre, na qual suspirou ao cadáver reconstituído do marido: “Eu sou a tua irmã bem amada. Não te afastes de mim, clamo por ti! Não ouves a minha voz? Venho ao teu encontro e, de ti, nada me separará!” Durante horas, Ísis e Néftis, de corpo purificado, inteiramente depiladas, com perucas perfumadas e boca purificada por natrão (carbonato de soda), pronunciaram encantamentos numa câmara funerária ignota, que o incenso queimado impregnava de espiritualidade. A deusa invocou então todos os templos e todas as cidades do país, para que estes se juntassem à sua dor e fizessem a alma de Osíris retornar do Além.

Uma vez que todos os seus esforços revelavam-se vãos, Ísis assumiu então a forma de um falcão, cujo esvoaçar restituiu o sopro de vida ao defunto, oferecendo-lhe o apanágio da ressurreição. Seguidamente, Ísis poisou no sítio do desaparecido sexo de Osíris, fazendo-o reaparecer por magia, e manteve-o vivo o tempo suficiente para que este a engravidasse. Em contraste, outras fontes garantem que Osíris e a sua esposa conceberam o seu filho, antes do deus ser assassinado pelo seu irmão, embora a versão mais comum seja a relatada, primeiramente. Assim, ao retornar à terra, Ísis encontrava-se agora grávida do filho, a quem protegeria até que este achasse-se capaz de enfrentar o seu tio, apoderando-se (como legítimo herdeiro) do trono que Seth havia usurpado. Alguns declaram que Ísis, algum tempo antes do parto, fora aprisionada por Seth, mas que Toth, vízir de Osíris, a auxiliara a libertar-se. Porém, muitos concordam que ela ocultou-se, secretamente, entre os papiros do Delta, onde se preparou para o nascimento do filho, o deus- falcão Hórus. Quando este nasceu, Ísis tomou a decisão de dedicar-se inteiramente à árdua incumbência de velar por ele. Todavia, a necessidade de ir procurar alimentos, coagiam-na pontualmente a ausentar-se, deixando assim o pequeno deus sem qualquer protecção. Numa dessas ocasiões, Seth transformou-se numa serpente, visando espalhar o seu veneno pelo corpo de Hórus, pelo que quando Ísis regressou da sua diligência, encontrou o seu filho já próximo das morte.

Todavia, a sua vida não foi ceifada, devido a um poderoso feitiço executado pelo deus- sol, Ra.
Dada a sua devotada protecção, Ísis era constantemente representada na arte egípcia a amamentar tanto o seu filho, como os faraós. Sendo um dos mais populares vultos da mitologia egípcia, cujo nome é representado por um trono (e crê-se que terá mesmo esse significado), Ísis assume o lugar de deusa da família e do casamento, a quem foram concedidos extraordinários poderes curativos, empregues, essencialmente, para salvar crianças de mordeduras de cobras. Devido às suas qualidades maternais, surge, por vezes, com a forma de uma porca ou de uma vaca, o que leva a que seja confundida com Háthor (deusa do amor), com quem, na realidade, se fundiu, na Época Baixa (664-332 a.C./ XXVI- XXX Dinastias), período de tempo em que o seu culto atingiu o auge. Deste modo, o seu culto proliferou-se por toda a bacia mediterrânea, na qualidade de Ísis- Afrodite, o que demonstra bem a forma como os romanos lhe prestavam culto, esculpindo imagens em sua homenagem, nas quais ela surgia, muitas vezes, com uma túnica que flutua ao vento e com um toucado composto por espigas, chifres de vaca, um disco solar e penas de avestruz.

Em torno do seu temperamento bravio (tão díspar da sua maternidade e benevolência!), teceu-se igualmente outra lenta, que narra a forma como Ísis, intrigada com o segredo que sustinha os poderes de Ra, conjura para obter o nome secreto do Senhor Universal, matriz das suas forças e esplendor. Assim, recolhe um pouco da sua saliva, amassa-a com terra e, com essa argila, molda uma serpente em forma de flecha, que coloca na encruzilhada dos caminhos desbravados pelo cortejo solar. Escrava da magia de Ísis, a serpente não hesita em morder Ra à sua passagem, que, com um silvo de dor, desfalece. Quando recupera a consciência, o deus- sol evoca, desesperado, todos os deuses, relatando-lhes o seu infortúnio: “ O meu pai e a minha mãe ensinaram-me o meu nome e eu dissimulei-o no meu corpo, para que mago algum o possa pronunciar como malefício para mim. Tinha eu saído para contemplar a minha criação, quando algo que desconheço me mordeu. Não foi nem fogo, nem água; mas o meu coração está em chamas, o meu corpo treme e os meus membros estão frios. Tragam-me os meus filhos, os que conhecem as fórmulas mágicas e cuja ciência chega aos céus!”. Ísis debruça-se sobre Rá e, simulando uma estupefacção imensurável, questiona: “ Que se passa? Ter-se-ia um dos teus filhos erguido contra ti? Então, destruí-lo-ei graças ao meu poder mágico e farei com que seja expulso da tua vista!” Quando o deus- sol lhe confidenciou a matriz do seu padecimento, Ísis assegurou-lhe que somente lhe entregaria o vital antídoto, caso este lhe revelasse a origem das suas imensuráveis forças.

Exasperada por Rá se negar a atender á sua reivindicação, Ísis solicitou, novamente: “Diz-me o teu nome, meu divino Pai! Porque o homem só revive quando é chamado pelo seu nome!”
Escravizado pelo desespero, a personificação da luz oferece a Ísis um rol interminável de nomes falsos, na ânsia de que a deusa não alcançasse a percepção de que ele procurava ludibriá-la. Todavia, Ísis replicou: “ O teu nome não está entre aqueles que citaste! Diz-mo e o veneno abandonará o teu corpo, porque o homem revive quando o seu nome é pronunciado.”
Subjugado pela dor, Rá aceita o ultimato, mesmo sabendo que tal concederia a Ísis autoridade sobre a sua pessoa. Num suspiro, declara então: “Olha, minha filha Ísis, de modo que o meu nome passe do meu corpo para o teu... Mal ele saia do meu coração, repete-o ao teu filho Hórus, submetendo-o a um juramento divino!”

Na realidade, todas as deusas egípcias possuíam esta dualidade, que as colocava entre a crueldade extrema e a indulgência infinita, num jogo de luzes e sombras que não as impediram de ser adoradas através dos tempos. A sua imagem é omnipresente e tanto cobre os sumptuosos santuários do Vale do Nilo, como os mais íntimos testemunhos de devoção pessoal. Porém, ao percorrermos o Egipto, deparamo-nos com três locais particularmente abençoados com a magia de Ísis:

Behbeit el- Hagar, no Delta, onde um sumptuoso templo foi erigido em honra de Ísis. Malogradamente, o halo de magia e espiritualidade que nimba esta excelsa deidade revelou-se impotente para deter aqueles que, não votando qualquer respeito pela sua índole sagrada, cometeram a ignomínia de destruir tão colossal santuário, onde os céus se reflectiam e renovavam num jogo divino, a fim de o transformar numa pedreira. Consequentemente, Behbeit el- Hagar é na actualidade um local quase literalmente desconhecido dos turistas e que semeia uma franca desilusão nos corações dos intrépidos que ainda o ousam visitar, pois a grandeza daquele que fora outrora um templo dedicado a uma divindade verdadeiramente excepcional resume-se agora a um monte de escombros e blocos de calcário ornados de cenas rituais.
Dendera, no alto Egipto, eterno berço de feitiços onde Ísis desabrochou para a vida, onde nos deparamos com um santuário de Háthor parcialmente conservado, com um templo coberto e com o mammisi, ou seja, “templo do nascimento de Hórus), assim como com um exíguo santuário, onde a etérea Ísis nasceu, deslumbrando o mundo com sua pele rosada e revolta cabeleira negra.
Filae, ilha- templo de Ísis, que serviu de refúgio à derradeira comunidade iniciática egípcia, mais tarde (séc. VI d. C., mais precisamente) exterminada por cristãos escravos do fanatismo.

Osiris.



Osíris é, indubitavelmente a mais célebre deidade do panteão egípcio e igualmente uma das mais complexas, pelo que não é, pois, de estranhar que os teólogos tenham procurado sintetizar os díspares aspectos desta personagem, através da criação de uma lenda. Para infortúnio de todos os amantes da mitologia egípcia a denominada “Lenda de Osíris” não é relatada integralmente por nenhum documento egípcio, fragmentando-se assim em trechos esparsos que relatam uma ou outra circunstância. Na realidade, a descrição completa das suas aventuras é nos oferecida por Plutarco, filósofo e escritor grego, através da sua obra “Ísis e Osíris”, na qual podemos verificar que a lenda se encontra dividida em três momentos fundamentais: o ímpio assassinato de Osíris; o nascimento e a infância de Hórus, seu filho; e o recontro entre este e Seth, aquele que lançara Osíris nos braços da morte.

Mas quem é afinal este deus, venerado por reis e plebeus, cujo coração encarnava a felicidade eterna, oferecida por seu pulsar a todos aqueles que o escutassem? Osíris despontou do seio da famigerada éneade de Heliópolis, denominação concedida à família divina criada por Átum-Rá, e na qual se reuniam nove poderosas deidades, cujas origens são narrados num mito arcaico da criação: Do caos inerte, que envolvia o universo, sob a forma do primitivo oceano Nun, emergiu uma colina de lodo, na qual poisou, latente no corpo de um escaravelho ou serpente, o deus- criador Átum, "Senhor Uno de nome misterioso", que através do seu sémen, gerou o primeiro casal divino, constituído por Shu, a atmosfera, e Tefnut, a humidade, os quais, por ser turno, procriaram Geb, a Terra, e Nut, o céu, cujos corpos achavam-se fundidos em eternas núpcias de luz. Devido à intervenção de Ra, a quem desagradava a visão de tal amor, Shu foi coagido a separar o céu e a terra. Porém, ao apartar tão sublimes amantes, o deus estava igualmente a sonhar uma imagem poética, incessantemente, representada pela arte egípcia, na qual, acima de Geb, surge um homem nu, alongado e enfeitado com plumas, erguendo nos braços Nut, de corpo semeado de estrelas.

O nascimento de Osíris, fruto dos amores entre o céu e a terra é nos relatado por um mito que não carece de originalidade: Quando o deus- sol Ra abraçou a percepção de que no jardim da alma de Nut, desabrochava a rosa do desejo, cujo perfume incensava os seus encontros clandestinos com Geb, ele tomou a resolução de confiná-lo ao álgido Inferno de uma maldição: a deusa é proibida de dar à luz no período de tempo compreendido pelo calendário oficial. Desesperada, Nut, que se encontrava grávida de quíntuplos, resolve então pedir ajuda a Thot, senhor do tempo, que segundo alguns referem, lhe dedica uma paixão secreta. Após haver meditado sobre todas as soluções plausíveis, Thot enlaça então a resolução de jogar aos dados com a Lua. Abençoado pela Fortuna, o deus ganha a partida e obtém cinco dias suplementares no calendário. Nestes cinco dias, considerados como distintos do ano de doze meses, a maldição perdia o seu efeito, pelo que Osíris pôde enfim sublimar o mundo com seu nascimento, ocorrido no primeiro destes dias. Segundo a lenda, no instante em que Osíris floresceu para a vida, uma voz incendiou os céus com o fogo da seguinte anunciação: “O Senhor de tudo veio ao mundo!”. Algumas fontes referem também que um certo Pamyles escutou uma voz provinda de um templo tebano, que, num grito tonitruante lhe anunciou que o magnânimo Osíris, rei dos céus e da terra, havia nascido. No segundo dos dias suplementares, Nut deu à luz Hórus, o Antigo; no terceiro, o deus Seth; no quarto, Ísis; e, por fim, no quinto, Néftis, desposada por Seth.

É na qualidade de primogénito, que Osíris herda a soberania terrestre, pelo que, após unir-se a Ísis em esponsais divinos, ascendeu ao trono do Egipto, iluminando este país com o Sol de magnanimidade e indulgência que dourava a sua alma. Reinando como soberano da terra, Osíris arrebatou os egípcios às garras da selvajaria que os escravizara até então, concedeu-lhes leis e fê-los descobrir a arte de prestar culto aos deuses. Por seu turno, Ísis, a quem a corrente prática de canibalismo horrorizava, ofereceu aos Homens o trigo e a cevada, que Osíris os ensinou a cultivar, levando-os a abdicar dos seus costumes antropófagos, em prole de uma dieta de cereais. Para além disso, Osíris é conhecido por haver sido o primeiro a colher frutos das árvores, a assentar a vinha em estacas e a pisar as uvas, visando a confecção de vinho. Na ânsia de enriquecer o tesouro da humanidade com a jóia rara do conhecimento, Osíris delegou a Ísis todas as responsabilidades subjacentes ao governo do Egipto e percorreu o mundo, saciando a sua sede com o cálice da civilização e a sua fome com o desvendar dos segredos da agricultura. O seu reinado foi assim uma sonata de harmonia perfeita, tocada no piano de luz da felicidade suprema. Todavia, em breve um artífice das trevas consagrado mestre da sua eterna confraria de sombras e medos, iria esculpir o mais nefasto silêncio, pois apesar dos poderes inerentes à sua divindade, Osíris viria a aproximar-se da humanidade, ao partilhar com ela a vereda da morte. Seu irmão Seth, esposo de Néftis, cuja alma era escrava da inveja, cobiça e ódio, ofereceu um fausto banquete, no qual exibiu uma extraordinária urna, prometendo oferecê-la, a quem nela coubesse.

Quando Osíris aceitou o desafio, Seth selou a urna e arremessou-a ao Nilo. Ao aperceber-se de que, após uma apaixonada busca, Ísis a havia encontrado, Seth tornou a apoderar-se dela, retalhando o corpo do irmão, para lançá-lo, novamente, ao rio. Desesperada, Ísis tomou então a resolução de recuperar os catorze fragmentos do cadáver de Osíris, percorrendo, para tal efeito, todo o país. Após conquistado o sucesso, Anúbis, deus do embalsamamento, possuidor de uma cabeça de chacal, e que muitos proclamam como filho de Osíris e de Néftis, reuniu os catorze fragmentos do cadáver do poderoso deus, enrolando-os em ligaduras, com o fito de criar a primeira múmia. Ísis tomou então a forma de um falcão fêmea, de cujas asas o seu esposo recebeu, uma vez mais, a vida que havia perdido, podendo então gerar o deus- falcão, Hórus, herdeiro do trono que o seu tio Seth havia usurpado. Ultimado este acto, Osíris necessitou de regressar ao submundo, tornando-se no "Senhor da Eternidade", soberano dos mortos, que preside aos julgamentos do além. É representado na arte egípcia como um homem de rosto esverdeado, qual lodo que concebe a vida do Egipto, ostentando as insígnias do poder: coroa, ceptro em gancho e chicote. Contudo, o seu corpo assemelha-se rígido, dado surgir como uma múmia enfaixada. Este mito reflecte flagrantemente uma paixão, representando Osíris como um ser que, na terra, foi vítima de uma traição que o teria confinado à extinção eterna, caso um amor isento de limites não se houvesse oposto a tão lúgubre fortuna, reinventando em seu corpo a arte perdida da vida, através de uma esplendorosa ressurreição. Compreende-se assim que todos procurem a benção deste deus, uma vez que somente ele coroa o firmamento da vida com o arco-íris da eternidade. Assim, não constitui qualquer surpresa verificar que no Antigo Império, o faraó defunto, na ânsia de com o deus se identificar, recebia o epíteto de Osíris, enquanto que o regente abraçava a denominação de Hórus. Todavia, vicissitudes político- sociais ocorridas no final do mesmo, permitiram que a benção de Osíris deixasse de ser prerrogativa exclusiva dos soberanos, estendendo-se assim a todos funcionários. No entanto, nem sempre Osíris usufruiu desta fama, sendo pois fruto de uma prolixa evolução.

Na realidade, Osíris foi venerado desde uma época muito antiga, principiando por encarnar um deus da fertilidade, relacionado com o milho, com o ciclo do seu enterramento como semente, o seu tempo de repouso debaixo da terra, a sua germinação e, finalmente, o seu retorno à vida. Era sua, portanto, a incumbência de propiciar aos egípcios uma boa colheita, sendo também responsável pela inundação do Nilo. À medida que a sua importância aumentava, Osíris assimilou características de outros deuses, os quais substituiu gradualmente. Em Mênfis, por exemplo, adoptou as características funerárias de Sokaris e, em Abidos, usurpou a identidade e o culto de Khentiamentiu, deus dos mortos e soberano das necrópoles. Posteriormente, integrou a cosmogonia de Heliópolis, transformando-se no legítimo herdeiro de Geb e Nut. Como símbolo da ressurreição, Osíris supervisionava as entradas no seu mundo, surgindo como um Sol, durante o poente. O culto de Osíris e Isís proliferou-se, com surpreendente popularidade, na bacia mediterrânea, durante a Época Baixa (664-332 a.C./ XXVI- XXX Dinastias), influenciando, segundo muitos historiadores também o cristianismo, com os seus ensinamentos sobre morte e ressurreição. Osíris, Ísis e Hórus formaram a Tríade (família constituída por três divindades) de Abidos, cidade onde se centralizou o seu culto, celebrado num dos maiores santuários egípcios, em cujo interior jazia a cabeça do deus da morte. Era de facto naquela que viria a tornar-se na capital da oitava província do Alto Egipto, que decorria o festival anual de Osíris, ao longo do qual a barca do deus era levada em procissão e a vitória de Osíris sobre os seus inimigos celebrada.

Todavia, também outras cidades foram iluminadas pela benção de Osíris, ao receberem partes do corpo retalhado do deus, salientando-se Busíris (“Domínio de Osíris” ou “Lugar de Osíris”, no Delta Central, como uma das mais famosas, dada a sua relação com a espinha dorsal de Osíris. Por seu turno, Per- Medjed, capital da 19ª capital do Alto Egípcio, estava ligada ao mito de Osíris, através do seu falo, que, segundo a tradição, jamais foi descoberto por Ísis.


Detalhes e Vocabulário Egípcio:
Eneada de Heliópolis: família divina constituída por Átum, deus criador, Tefnu, humidade, Shu, atmosfera, Geb, terra, Nut, céu, Osíris, Ísis, Néftis e Seth.
Ousir- Osíris
Neb djed- O Senhor da Eternidade.
Douat- submundo
Sah- múmia

Hórus



Hórus, mítico soberano do Egipto, desdobra as suas divinas asas de falcão sob a cabeça dos faraós, não somente meros protegidos, mas, na realidade, a própria incarnação do deus do céu. Pois não era ele o deus protector da monarquia faraónica, do Egipto unido sob um só faraó, regente do Alto e do Baixo Egipto? Com efeito, desde o florescer da época história, que o faraó proclamava que neste deus refulgia o seu ka (poder vital), na ânsia de legitimar a sua soberania, não sendo pois inusitado que, a cerca de 3000 a. C., o primeiro dos cinco nomes da titularia real fosse exactamente “o nome de Hórus”. No panteão egípcio, diversas são as deidades que se manifestam sob a forma de um falcão. Hórus, detentor de uma personalidade complexa e intrincada, surge como a mais célebre de todas elas. Mas quem era este deus, em cujas asas se reinventava o poder criador dos faraós? Antes de mais, Hórus representa um deus celeste, regente dos céus e dos astros neles semeados, cuja identidade é produto de uma longa evolução, no decorrer da qual Hórus assimila as personalidades de múltiplas divindades.

Originalmente, Hórus era um deus local de Sam- Behet (Tell el- Balahun) no Delta, Baixo Egipto. O seu nome, Hor, pode traduzir-se como “O Elevado”, “O Afastado”, ou “O Longínquo”. Todavia, o decorrer dos anos facultou a extensão do seu culto, pelo que num ápice o deus tornou-se patrono de diversas províncias do Alto e do Baixo Egipto, acabando mesmo por usurpar a identidade e o poder das deidades locais, como, por exemplo, Sopedu (em zonas orientais do Delta) e Khentekthai (no Delta Central). Finalmente, integra a cosmogonia de Heliópolis enquanto filho de Ísis e Osíris, englobando díspares divindades cuja ligação remonta a este parentesco. O Hórus do mito osírico surge como um homem com cabeça de falcão que, à semelhança de seu pai, ostenta a coroa do Alto e do Baixo Egipto. É igualmente como membro desta tríade que Hórus saboreia o expoente máximo da sua popularidade, sendo venerado em todos os locais onde se prestava culto aos seus pais. A Lenda de Osíris revela-nos que, após a celestial concepção de Hórus, benção da magia que facultou a Ísis o apanágio de fundir-se a seu marido defunto em núpcias divinas, a deusa, receando represálias por parte de Seth, evoca a protecção de Ré- Atum, na esperança de salvaguardar a vida que florescia dentro de si.

Receptivo às preces de Ísis, o deus solar velou por ela até ao tão esperado nascimento. Quando este sucedeu, a voz de Hórus inebriou então os céus: “ Eu sou Hórus, o grande falcão. O meu lugar está longe do de Seth, inimigo de meu pai Osíris. Atingi os caminhos da eternidade e da luz. Levanto voo graças ao meu impulso. Nenhum deus pode realizar aquilo que eu realizei. Em breve partirei em guerra contra o inimigo de meu pai Osíris, calcá-lo-ei sob as minhas sandálias com o nome de Furioso... Porque eu sou Hórus, cujo lugar está longe dos deuses e dos homens. Sou Hórus, o filho de Ísis.” Temendo que Seth abraçasse a resolução de atentar contra a vida de seu filho recém- nascido, Ísis refugiou-se então na ilha flutuante de Khemis, nos pântanos perto de Buto, circunstância que concedeu a Hórus o epíteto de Hor- heri- uadj, ou seja, “Hórus que está sobre a sua planta de papiro”. Embora a natureza inóspita desta região lhe oferecesse a tão desejada segurança, visto que Seth jamais se aventuraria por uma região tão desértica, a mesma comprometia, concomitantemente, a sua subsistência, dada a flagrante escassez de alimentos característica daquele local. Para assegurar a sua sobrevivência e a de seu filho, Ísis vê-se obrigada a mendigar, pelo que, todas as madrugadas, oculta Hórus entre os papiros e erra pelos campos, disfarçada de mendiga, na ânsia de obter o tão necessário alimento. Uma noite, ao regressar para junto de Hórus, depara-se com um quadro verdadeiramente aterrador: o seu filho jazia, inanimado, no local onde ela o abandonara. Desesperada, Ísis procura restituir-lhe o sopro da vida, porém a criança encontrava-se demasiadamente débil para alimentar-se com o leite materno. Sem hesitar, a deusa suplica o auxílio dos aldeões, que todavia se relevam impotentes para a socorrer.

Quando o sofrimento já quase a fazia transpor o limiar da loucura, Ísis vislumbrou diante de si uma mulher popular pelos seus dons de magia, que prontamente examinou o seu filho, proclamando Seth alheio ao mal que o atormentava. Na realidade, Hórus ( ou Harpócrates, Horpakhered- “Hórus menino/ criança”) havia sido simplesmente vítima da picada de um escorpião ou de uma serpente. Angustiada, Ísis verificou então a veracidade das suas palavras, decidindo-se, de imediato, e evocar as deusas Néftis e Selkis (a deusa- escorpião), que prontamente ocorreram ao local da tragédia, aconselhando-a a rogar a Ré que suspendesse o seu percurso usual até que Hórus convalescesse integralmente. Compadecido com as suplicas de uma mãe, o deus solar ordenou assim a Toth que salvasse a criança. Quando finalmente se viu diante de Hórus e Ísis, Toth declarou então: “ Nada temas, Ísis! Venho até ti, armado do sopro vital que curará a criança. Coragem, Hórus! Aquele que habita o disco solar protege-te e a protecção de que gozas é eterna. Veneno, ordeno-te que saias! Ré, o deus supremo, far-te-á desaparecer. A sua barca deteve-se e só prosseguirá o seu curso quando o doente estiver curado. Os poços secarão, as colheitas morrerão, os homens ficarão privados de pão enquanto Hórus não tiver recuperado as suas forças para ventura da sua mãe Ísis. Coragem, Hórus. O veneno está morto, ei- lo vencido.”

Após haver banido, com a sua magia divina, o letal veneno que estava prestes a oferecer Hórus à morte, o excelso feiticeiro solicitou então aos habitantes de Khemis que velassem pela criança, sempre que a sua mãe tivesse necessidade de se ausentar. Muitos outros sortilégios se abateram sobre Hórus no decorrer da sua infância (males intestinais, febres inexplicáveis, mutilações), apenas para serem vencidos logo de seguida pelo poder da magia detida pelas sublimes deidades do panteão egípcio. No limiar da maturidade, Hórus, protegido até então por sua mãe, Ísis, tomou a resolução de vingar o assassinato de seu pai, reivindicando o seu legítimo direito ao trono do Egipto, usurpado por Seth. Ao convocar o tribunal dos deuses, presidido por Rá, Hórus afirmou o seu desejo de que seu tio deixasse, definitivamente, a regência do país, encontrando, ao ultimar os seus argumentos, o apoio de Toth, deus da sabedoria, e de Shu, deus do ar. Todavia, Ra contestou-os, veementemente, alegando que a força devastadora de Seth, talvez lhe concedesse melhores aptidões para reinar, uma vez que somente ele fora capaz de dominar o caos, sob a forma da serpente Apópis, que invadia, durante a noite, a barca do deus- sol, com o fito de extinguir, para toda a eternidade, a luz do dia. Ultimada uma querela verbal, que cada vez mais os apartava de um consenso, iniciou-se então uma prolixa e feroz disputa pelo poder, que opôs em confrontos selváticos, Hórus a seu tio. Após um infrutífero rol de encontros quase soçobrados na barbárie, Seth sugeriu que ele próprio e o seu adversário tomassem a forma de hipopótamos, com o fito de verificar qual dos dois resistiria mais tempo, mantendo-se submergidos dentro de água.

Escoado algum tempo, Ísis foi incapaz de refrear a sua apreensão e criou um arpão, que lançou no local, onde ambos haviam desaparecido. Porém, ao golpear Seth, este apelou aos laços de fraternidade que os uniam, coagindo Ísis a sará-lo, logo em seguida. A sua intervenção enfureceu Hórus, que emergiu das águas, a fim de decapitar a sua mãe e, acto contíguo, levá-la consigo para as montanhas do deserto. Ao tomar conhecimento de tão hediondo acto, Rá, irado, vociferou que Hórus deveria ser encontrado e punido severamente. Prontamente, Seth voluntariou-se para capturá-lo. As suas buscas foram rapidamente coroadas de êxito, uma vez que este nem ápice se deparou com Hórus, que jazia, adormecido, junto a um oásis. Dominado pelo seu temperamento cruel, Seth arrancou ambos os olhos de Hórus, para enterrá-los algures, desconhecendo que estes floresceriam em botões de lótus. Após tão ignóbil crime, Seth reuniu-se a Rá, declarando não ter sido bem sucedido na sua procura, pelo que Hórus foi então considerado morto. Porém, a deusa Hátor encontrou o jovem deus, sarando-lhe, miraculosamente, os olhos, ao friccioná-los com o leite de uma gazela. Outra versão, pinta-nos um novo quatro, em que Seth furta apenas o olho esquerdo de Hórus, representante da lua. Contudo, nessa narrativa o deus-falcão, possuidor, em seus olhos, do Sol e da lua, é igualmente curado.

Em ambas as histórias, o Olho de Hórus, sempre representado no singular, torna-se mais poderoso, no limiar da perfeição, devido ao processo curativo, ao qual foi sujeito. Por esta razão, o Olho de Hórus ou Olho de Wadjet surge na mitologia egípcia como um símbolo da vitória do bem contra o mal, que tomou a forma de um amuleto protector. A crença egípcia refere igualmente que, em memória desta disputa feroz, a lua surge, constantemente, fragmentada, tal como se encontrava, antes que Hórus fosse sarado. Determinadas versões desta lenda debruçam-se sobre outro episódio de tão desnorteante conflito, em que Seth conjura novamente contra a integridade física de Hórus, através de um aparentemente inocente convite para o visitar em sua morada. A narrativa revela que, culminado o jantar, Seth procura desonrar Hórus, que, embora precavido, é incapaz de impedir que um gota de esperma do seu rival tombe em suas mãos. Desesperado, o deus vai então ao encontro de sua mãe, a fim de suplicar-lhe que o socorra. Partilhando do horror que inundava Hórus, Ísis decepou as mãos do filho, para arremessá-las de seguida à água, onde graças à magia suprema da deus, elas desaparecem no lodo. Todavia, esta situação torna-se insustentável para Hórus, que toma então a resolução de recorrer ao auxílio do Senhor Universal, cuja extrema bonomia o leva a compreender o sofrimento do deus- falcão e, por conseguinte, a ordenar ao deus- crocodilo Sobek, que resgatasse as mãos perdidas. Embora tal diligência haja sido coroada de êxito, Hórus depara-se com mais um imprevisto: as suas mãos tinham sido abençoadas por uma curiosa autonomia, incarnando dois dos filhos do deus- falcão.

Novamente evocado, Sobek é incumbido da taregfa de capturar as mãos que teimavam em desaparecer e levá-las até junto do Senhor Universal, que, para evitar o caos de mais uma querela, toma a resolução de duplicá-las. O primeiro par é oferecido à cidade de Nekhen, sob a forma de uma relíquia, enquanto que o segundo é restituído a Hórus. Este prolixo e verdadeiramente selvático conflito foi enfim solucionado quando Toth persuadiu Rá a dirigir uma encomiástica missiva a Osíris, entregando-lhe um incontestável e completo título de realeza, que o obrigou a deixar o seu reino e confrontar o seu assassino. Assim, os dois deuses soberanos evocaram os seus poderes rivais e lançaram-se numa disputa ardente pelo trono do Egipto. Após um recontro infrutífero, Ra propôs então que ambos revelassem aquilo que tinham para oferecer à terra, de forma a que os deuses pudessem avaliar as suas aptidões para governar. Sem hesitar, Osíris alimentou os deuses com trigo e cevada, enquanto que Seth limitou-se a executar uma demonstração de força. Quando conquistou o apoio de Ra, Osíris persuadiu então os restantes deuses dos poderes inerentes à sua posição, ao recordar que todos percorriam o horizonte ocidental, alcançando o seu reino, no culminar dos seus caminhos. Deste modo, os deuses admitiram que, com efeito, deveria ser Hórus a ocupar o trono do Egipto, como herdeiro do seu pai. Por conseguinte, e volvidos cerca de oito anos de altercações e recontros ferozes, foi concedida finalmente ao deus- falcão a tão cobiçada herança, o que lhe valeu o título de Hor-paneb-taui ou Horsamtaui/Horsomtus, ou seja, “Hórus, senhor das Duas Terras”.

Como compensação, Rá concedeu a Seth um lugar no céu, onde este poderia desfrutar da sua posição de deus das tempestades e trovões, que o permitia atormentar os demais. Este mito parece sintetizar e representar os antagonismos políticos vividos na era pré- dinástica, surgindo Hórus como deidade tutelar do Baixo Egipto e Seth, seu oponente, como protector do Alto Egipto, numa clara disputa pela supremacia política no território egípcio. Este recontro possui igualmente uma cerca analogia com o paradoxo suscitado pelo combate das trevas com a luz, do dia com a noite, em suma, de todas as entidades antagónicas que encarnam a típica luta do bem contra o mal. A mitologia referente a este deus difere consoante as regiões e períodos de tempo. Porém, regra geral, Hórus surge como esposo de Háthor, deusa do amor, que lhe ofereceu dois filhos: Ihi, deus da música e Horsamtui, “Unificador das Duas Terras”. Todavia, e tal como referido anteriormente, Hórus foi imortalizado através de díspares representações, surgindo por vezes sob uma forma solar, enquanto filho de Atum- Ré ou Geb e Nut ou apresentado pela lenda osírica, como fruto dos amores entre Osíris e Ísis, abraçando assim diversas correntes mitológicas, que se fundem, renovam e completam em sua identidade. É dos muitos vectores em que o culto solar e o culto osírico, os mais relevantes do Antigo Egipto, se complementam num oásis de Sol, pátria de lendas de luz, em cujas águas d’ ouro voga toda a magia de uma das mais enigmáticas civilizações da Antiguidade.

Detalhes e vocabulário egípcio:
culto de Hórus centralizava-se na cidade de Edfu, onde particularmente no período ptolomaico saboreou uma estrondosa popularidade;
culto do deus falcão dispersou-se em inúmeros sub- cultos, o que criou lendas controversas e inúmeras versões do popular deus, como a denominada Rá- Harakhty;
as estelas (pedras com imagens) de Hórus consideravam-se curativas de mordeduras de serpentes e picadas de escorpião, comuns nestas regiões, dado representarem o deus na sua infância vencendo os crocodilos e os escorpiões e estrangulando as serpentes. Sorver a água que qualquer devotado lhe houvesse deixado sobre a cabeça, significava a obtenção da protecção que Ísis proporcionava ao filho. Nestas estelas surgia, frequentemente, o deus Bes, que deita a língua de fora aos maus espíritos. Os feitiços cobrem os lados externos das estelas. Encontramos nelas uma poderosa protecção, como salienta a famigerada Estela de Mettenich: “Sobe veneno, vem e cai por terra. Hórus fala-te, aniquila-te, esmaga-te; tu não te levantas, tu cais, tu és fraco, tu não és forte; tu és cego, tu não vês; a tua cabeça cai para baixo e não se levanta mais, pois eu sou Hórus, o grande Mágico.”.
out- embalsamadores
vabet- lugar de purificação


Verónica Freitas

Sublime Cerimonia.



O progresso dentro da Maçonaria exige dos seus membros a passagem por tantas outras cerimónias de admissão nos graus; há contudo uma cerimónia que está acima da concessão de qualquer grau, e a mais sublime de todas elas, é a Cerimónia de Instalação.

Instalação é o acto pelo qual se dá posse de um cargo ou de uma dignidade: Investidura. Chama-se Instalação somente aquela que concede o direito de exercer privilégios de um ofício. Em Maçonaria, diz-se do acto que inaugura uma Oficina devidamente autorizada e na qual é instalada a sua primeira administração. Os Oficiais de uma Loja, depois de sua eleição e antes de poderem exercer as suas funções, devem ser instalados. É, principalmente, a cerimónia pela qual os Grãos-Mestres e os Veneráveis são colocados no trono da sabedoria.

Os Oficiais de uma nova Loja são instalados pelo Grão-Mestre ou por algum ex-Venerável presente (Mestre Instalador), e o Venerável eleito instala então os oficiais subordinados.

É uma lei da Maçonaria que todos os oficiais se mantenham nos seus postos até serem instalados os seus sucessores.

A Instalação é uma cerimónia maçónica que entrou em uso desde os primeiros tempos da Maçonaria especulativa. Referindo-se à maneira de construir uma nova Loja, dizem as Constituições de 1723 que, depois de certos preliminares, "o Grão-Mestre, por certas cerimónias significativas e segundo os antigos usos, instalará (o primeiro Mestre) apresentando-lhe as Constituições, o Livro da Loja e os Instrumentos do seu ofício, não todos juntos, mas um por um; e depois de cada um deles, o Grão-Mestre ou seu Delegado, se referirá ao limitado e expressivo dever adequado ao objecto apresentado".

O Mestre Instalador, denominação dada à pessoa que realiza a chamada Cerimónia de Instalação, que devem ser submetidos Veneráveis e Grão-Mestres eleitos, obedecendo a regra maçónica que todo aquele que foi instalado num cargo pode instalar outro num cargo similar ou inferior.

Contudo, a estrita regra maçónica exige a presença de três Past-Masters na Instalação de um Venerável. Past-Master é o titulo dado na Maçonaria anglo-saxónica ao ex-Venerável de uma Loja Simbólica, significando que já "passou" pela cadeira do Rei Salomão. No Brasil, o título foi adoptado pelas Grandes Lojas, enquanto no Grande Oriente se diz "ex-Venerável". Ao término do seu mandato, o Venerável transmite o cargo a outro Mestre eleito regularmente pelos membros do quadro, passando a ser então um ex-Venerável ou Past-Master, isto é, aquele que já foi Mestre ou Venerável e conservando, naturalmente, quando for o caso, a sua condição de Mestre Instalado. O primeiro Venerável de uma Loja somente pode ser Instalado por um Grão-Mestre, ou por um Past-Master especialmente indicado para actuar como seu substituto.

PARA SER VENERÁVEL DE UMA LOJA
O Venerável Mestre deve ter estudado a ciência maçónica e desempenhado os postos e dignidades inferiores. É necessário que possua um conhecimento profundo do homem e da sociedade, além de um carácter firme, mas razoável. As atribuições e deveres dos Veneráveis são muitos e de várias índoles e acham-se definidos e detalhados com precisão, de acordo com o Rito, a Constituição, o Código Maçónico, Leis e Resoluções da Potência de sua jurisdição, os decretos e Actos do Grão-Mestre, o Regulamento Particular e as deliberações da Loja.

Segundo o Ir.'. Gonzáles Ginório, da Venezuela, para ser Venerável Mestre de uma Oficina Maçónica, e por conseguinte tornar-se o guia dos Irmãos que compõem a sua Loja, o candidato deve possuir os seguintes predicados:

Sentir-se Maçon, de preferência a qualquer outra formação doutrinária;
Não ser indiscreto, injusto ou indiferente;
Não estar despido de entusiasmo e de espírito;
Não ser indisciplinado, intolerante, inconformado e irascível;
Não ser invejoso, apaixonado, rancoroso e intrigante;
Ser estudioso e não superficial;
Não alardear e abusar de sua inteligência;
Não cabalar em eleições;
Não pedir, suplicar ou de qualquer forma desejar posições.
Há sem dúvida um Sinal infalível: o verdadeiro candidato para o posto governante de sua Loja é o Maçon que não pede cargo; não o cobiça e que, aspirando essa exaltação como um ideal, não se julga merecedor dela. Sentir-se sem mérito para um posto de preeminência é apreciar a dignidade do cargo e começar a ser merecedor do mesmo.

Conhecidos os pré requisitos que deve possuir um Venerável Mestre, devem os Mestres maçons, instalados ou não, procurarem nas suas Oficinas Irmãos que atendam a estas condições para que possam ser "o Pai, o Conselheiro, o Chefe e para tanto, deve ser aquele que harmoniza e pacifica; aquele agente transformador, aquele que, transformando-se, ajuda o seu Irmão também transformar-se; que passa a viver e representar a vontade da maioria sem impor a sua própria vontade". Essa reunião de elementos concretos ou abstractos de um todo, só reúne um líder que "mobiliza" os Irmãos a seu favor, que define as metas, mostra os caminhos e faz com que todos tenham vontade e orgulho de caminhar a seu lado.

Para ser claro, ser Venerável Mestre de uma Loja requer que o Mestre maçon, regularmente Iniciado, Elevado e Exaltado, possua:

reputação ilibada;
seja sincero e verdadeiro;
seja afável no trato, inabalável, firme, arraigado, constante, intrépido e intransigente em seus princípios;
seja amante da sabedoria;
versado na nobre ciência da Arte Real, e
ter sido legalmente eleito pelos Mestres Maçons de sua Loja.
É na Oficina que se forja o homem maçon que irá zelar pelos destinos maiores da Sublime Instituição.

O cargo de Venerável é electivo e temporário. O exercício do cargo de Venerável dignifica seu ocupante, por ter sido escolhido entre os seus pares para a distinção de representá-los e conduzi-los à continuidade, visto, pois, como iluminado para a direcção dos trabalhos, e tudo com sabedoria precisa para a orientação dos obreiros do quadro.

Na essência, o Venerável Mestre é um coordenador, um instrumento gerador de frequência, de vibração, um modelo organizador, mediador, aglutinador, preceptor, é com certeza um líder, tendo por princípio ser possuidor de grandes virtudes, e não um mandante, decisor, chefe ou ditador, mesmo porque lhe cabe manter a união do grupo, a harmonia do todo, o exemplo da conduta maçónica. É só ter a coragem de enxergar as coisas como elas são, sem ter a mente embaçada, pelo conformismo, e saber diferenciá-los. Mas isto tudo não se completará se o Venerável se esquecer da humildade e do senso de justiça que o cargo exige.

Se não for possível ao Irmão ter certeza de possuir os pré requisitos de um Venerável Mestre ou, ainda, as qualidades de um Mestre Instalado, não deve aceitar o Primeiro Malhete de sua Oficina.

Este Mestre deve ser o exemplo da conduta moral e espiritual de uma comunidade maçónica, pois este é o seu destino, assumido de livre e espontânea vontade. Deverá ser o espelho de sua Oficina ou sua Oficina seu espelho. Deverá ser um exemplo no cumprimento das Leis, Regulamentos, Regimentos, etc., que regem a Sublime Instituição, não descurando, no mínimo detalhe, da ritualística.

Concluindo, diríamos que, somente seremos fortes, individual e colectivamente, no dia em que conhecermos nossas fraquezas e nos dispusermos ao trabalho de sustentação das Colunas, suporte, amparo, e apoio do Venerável Mestre de nossa Augusta e Respeitável Loja Simbólica, pois sabemos que o homem se mantém e cresce na proporção da força do apoio de seus Irmãos.

Artigo do I:. Valdemar Sansão

Maçonaria.'.



Organizações de ofício, as precursoras
Desde que o homem deixou as cavernas e as suas vivendas de nómada, sedentarizando-se e formando uma sociedade estratificada, surgiram os profissionais dedicados à arte da construção, os quais foram se aperfeiçoando, não só na erecção de casas de residência, mas, também, na de templos, de obras públicas e obras de arte. Embora tivessem, esses profissionais, desde os seus primeiros tempos, mantido, entre si, certa camaradagem e um sentimento de agregação, não havia, na realidade, uma organização que os reunisse, que regulasse a sua actividade e que lhes desse um maior sentido de responsabilidade profissional.

Foi no Império Romano do Ocidente, da Roma conquistadora, que, em função da própria actividade bélica, surgiu, no século VI a.C., a primeira associação organizada de construtores, os Collegia Fabrorum. Como a conquista das vastas regiões da Europa, da Ásia e do norte da África, levava à destruição, os collegiati acompanhavam as legiões romanas, para reconstruir o que fosse sendo destruído pela guerra. Dotada de forte carácter religioso, essa organização dava, ao trabalho, o cunho sagrado de um culto às divindades. De início politeísta, tornou-se, com a expansão do cristianismo, monoteísta, entrando, porém, em decadência, após a queda do Império Romano do Ocidente, ocorrida em 476 d.C., embora persistissem pequenos grupos da associação no Império Romano do Oriente, cujo centro era Constantinopla.

Na Idade Média é que iria florescer, através do grande poder da época, a Igreja, a hoje chamada Maçonaria Operativa, ou Maçonaria de Ofício, para a preservação da Arte Real entre os mestres construtores da Europa. Assim, a partir do século VI, as Associações Monásticas, formadas, principalmente, por clérigos, dominavam o segredo da arte de construir, que ficou restrita aos conventos, já que, naquela época de barbárie, quando a Europa estava em ruínas, graças às sucessivas invasões dos bárbaros, e quando as guerras, os roubos e os saques eram frequentes e até encarados como fatos normais, os artistas e arquitectos encontraram refúgio seguro nos conventos.

Posteriormente, pela necessidade de expansão, os frades construtores começaram a preparar e a adestrar leigos, proporcionando, a partir do século X, a organização das Confrarias Leigas, que, embora formadas por leigos, recebiam forte influência do clero, do qual haviam aprendido a arte de construir e o cunho religioso dado ao trabalho.

É dessa época aquela que é considerada a primeira reunião organizada de operários construtores: a Convenção de York, ocorrida em 926 e convocada por Edwin, filho do rei Athelstan, para reparar os prejuízos que as associações haviam tido com as sucessivas guerras e invasões. Nela foi apresentada, para apreciação e aprovação, um estatuto, que, dali em diante, deveria servir como lei suprema da confraria e que é, geralmente, chamado de Carta de York.

Quase na mesma época, surgiriam associações simplesmente religiosas, que, a partir do século XII, formaram corpos profissionais: as Guildas. A elas se deve o primeiro documento em que é mencionada a palavra "Loja", para designar uma corporação e o seu local de trabalho. As Guildas e sua contemporânea, a organização dos Ofícios Francos, foram as principais precursoras da moderna Maçonaria. O seu nome "Gild", de origem teutónica, deriva do título dado, na antiga região da Escandinávia, a um ágape religioso, durante o qual, numa cerimónia especial, eram despejados três copos de chifre (chavelhos), conforme o uso da época, cheios de cerveja, sendo um em homenagem aos deuses, outro, pelos antigos heróis, e o último em homenagem aos parentes e em memória dos amigos mortos; ao final da cerimónia, todos os participantes juravam defender uns aos outros, como irmãos, socorrendo-se mutuamente nos momentos difíceis. As Guildas caracterizavam-se por três finalidades principais: auxílio mútuo, reuniões em banquetes e autuação por reformas políticas e sociais. Introduzidas na Inglaterra, por reis saxões, elas foram modificadas por influência do cristianismo, mas, mesmo assim, não eram bem aceitas pela Igreja, que não via com bons olhos a prática do banquete, por suas origens pagãs, e a pretensão de reformas políticas e sociais, que pudessem, eventualmente, contribuir para diminuir os seus privilégios e os privilégios das corporações sob a sua protecção. Assim, para evitar a hostilidade da Igreja, cada guilda era organizada sob a égide de um monarca, ou sob o nome de um santo protector.

No século XII, associada às guildas, surgia uma organização de operários alemães, os Steinmetzen, ou seja, canteiros, que, sob a direcção de Erwin de Steinbach, alcançariam notoriedade, quando este conseguiu a aprovação de seus planos para a construção da catedral de Estrasburgo e deu um aperfeiçoado sentido de organização aos seus obreiros. Canteiro é o operário que trabalha em cantaria, que esquadreja e trabalha na escultura da pedra bruta; cantaria (palavra derivada de canto) designa a pedra lavrada para as construções.

Surgem os ofícios francos, ou franco-maçonaria
No século XII, também, iria florescer a associação considerada a mais importante desse período operativo: os Ofícios Francos (ou Franco-Maçonaria), formados por artesãos privilegiados, com liberdade de locomoção e isentos das obrigações e impostos reais, feudais e eclesiásticos. Tratava-se, portanto, de uma organização de construtores categorizados, diferentes dos operários servos, que ficavam presos a uma mesma região, a um mesmo feudo, à disposição de seus amos. Na Idade Média, a palavra franco designava não só o que era livre, em oposição ao que era servil, mas, também, todos os indivíduos e todos os bens que escapavam às servidões e aos direitos senhoriais; esses artesãos privilegiados eram, então, os pedreiros-livres, franc-maçons, para os franceses, ou free-masons, para os ingleses. Tais obreiros, evidentemente, tinham esses privilégios concedidos pela Igreja, que era o maior poder político da época, com grande ascendência sobre os governantes.

A palavra francesa "maçon", correspondente a pedreiro, converteu-se em "maison" (casa) e, também, embora só relativamente, em "masse" (maça, clava). Essa maça, ou clava, habilitava o porteiro a afastar os indesejáveis intrusos e curiosos. O pesquisador alemão Lessing, um dos clássicos da literatura alemã, atribui a palavra inglesa "masonry" (maçonaria) a uma transmissão incorrecta. Originalmente, a ideia teria sido dada pelo velho termo inglês "mase" (missa, reunião à mesa). Uma tal sociedade de mesa, ou reunião de comensais, de acordo com a alegoria da Távora Redonda, do rei Artur, poderia, segundo Lessing, ainda ser encontrada em Londres, no século XVII. Ela se reunia nas proximidades da famosa catedral de São Paulo e, quando sir Christopher Wren, o construtor da catedral, tornou-se membro desse círculo, julgou-se que se tratava de uma cabana dos construtores, que estabelecia uma ligação de mestres construtores e obreiros; daí, então, ou seja, dessa suposição errada, é que teria se originado o termo "masonry", para designar a sociedade dos construtores.

Uma explicação para o termo inglês "freemason" (pedreiro livre) está ligada ao termo "freestone", que é a pedra de cantaria, ou seja, a pedra própria para ser esquadrejada, para que nela sejam feitos cantos, que a transformem numa pedra cúbica, a ser usada nas construções. As expressões "freestone mason" e "freestone masonry", daí surgidas, acabaram sendo simplificadas para "freemason" (o obreiro) e "freemasonry" (a actividade). Esta é uma hipótese mais plausível do que a de Lessing, que só considerou o caso particular da Inglaterra, quando se sabe que não foi só aí que existiu uma íntima ligação com o trabalho dos artífices da construção.

Nessa fase primitiva, porém, antes de, propriamente, se ter iniciado a formação de Lojas, quase que não se pode falar em Maçonaria no sentido que ela adquiriu na fase moderna, pois, sobretudo, naquele tempo não podia ser considerada como uma sociedade secreta. O segredo não era, a princípio, mais do que o processo pelo qual um dos membros da irmandade reconhecia o outro. Diga-se a bem da verdade, que, na época actual, a Maçonaria já não pode mais ser considerada secreta, mas apenas discreta. Os segredos mais guardados e que persistem são, obviamente, apenas os meios de reconhecimento, reservados só aos iniciados, já que, de posse deles, um não iniciado poderia ter acesso aos templos maçónicos e às sessões das Lojas.

É criado o importante estilo gótico
Na metade do século XII, surgia o estilo arquitectónico gótico, ou germânico, primeiro no norte da França, espalhando-se, depois, pela Inglaterra, Alemanha e outras regiões do norte da Europa e tendo o seu apogeu na Alemanha, durante 300 anos. Tão importante foi o estilo gótico para as confrarias de construtores, que as suas regras básicas eram ensinadas nas oficinas dos canteiros, ou talhadores de pedra; tão importante que a sua decadência, no século XVI, decretou o declínio das corporações.

No século XIII, em 1220, era fundada, na Inglaterra, durante o reinado de Henrique III, uma corporação dos pedreiros de Londres, que tomou o título de The Hole Craft and Fellowship of Masons (Santa Arte e Associação dos Pedreiros) e que, segundo alguns autores, seria o germe da moderna Maçonaria. Pouco depois, em 1275, ocorria a Convenção de Estrasburgo, convocada pelo mestre dos canteiros e da catedral de Estrasburgo, Erwin de Steinbach, para terminar as obras do templo. A construção da catedral, iniciada em 1015, estava praticamente terminada, quando foi resolvido ampliar o projecto original e, para isso, foi chamado Erwin A essa convenção acorreram os mais famosos arquitectos da Inglaterra, da Alemanha e da Itália, que criaram uma Loja, para as assembleias e discussão sobre o andamento dos trabalhos, elegendo Erwin como Mestre de Cátedra (Meister von sthul).

Esclareça-se que, na época, os obreiros criavam uma Loja, fundamentalmente, para tratar de determinada construção, como é o caso dessa catedral. Tais Lojas serviam para tratar dos assuntos ligados apenas à construção prevista, já que, para outras reuniões, inclusive com obreiros de outras corporações, eram utilizados os recintos de tabernas e hospedarias, principalmente em solo inglês. A palavra Loja, por sinal, foi mencionada pela primeira vez em 1292, em documento de uma guilda . Loja, do germânico leubja (pronúncia: lóibja), através do francês lodge, designava o lar, a casa, o abrigo, o pátio, o alpendre e, também, a entrada de edifício, ou galeria usada para exposições artísticas e venda de produtos artesanais. As guildas de mercadores assim designavam seus locais de depósito e venda de produtos manufacturados, enquanto que as guildas artesanais adoptaram o termo para designar o seu local de trabalho, ou seja, as oficinas dos artífices.

Próximo desse tempo, ou seja, no século XIV, começava, também, a actuação do Compagnonnage (Companheirismo), criado pelos cavaleiros templários . Os membros dessa organização construíram, no Oriente Médio, formidáveis cidadelas, adquirindo certo número de métodos de trabalho herdados da Antiguidade e constituindo, durante as Cruzadas, verdadeiras oficinas itinerantes, para a construção de obras de defesa militar, pontes e santuários. Retornando à Europa, eles tiveram a oportunidade de exercer o seu ofício, construindo catedrais, igrejas, obras públicas e monumentos civis. A Ordem da Milícia do Templo, ou Ordem dos Templários, foi uma ordem religiosa e militar, criada em 1118, com estatutos feitos pelo abade de Clairvaux (São Bernardo). Adquirindo prestígio e riqueza, a ordem excitaria a cobiça do rei francês Filipe IV, cognominado "o Belo", que, com a conivência do papa Clemente V, conseguiu a sua extinção, em 1312, seguida da execução, na fogueira, de seu Grão-Mestre, Jacques de Molay, em 1314. Antes da extinção, necessitando, em suas distantes comendadorias do Oriente, de trabalhadores cristãos, os templários organizaram o Compagnonnage, dando-lhe um estatuto chamado Santo Dever, de acordo com sua própria filosofia.

No século XVI, a decadência das corporações de ofício
Já na primeira metade do século XVI, as corporações, diante das perseguições que sofriam - principalmente por parte do clero - e diante da evolução social europeia, começavam a entrar em declínio. Em 1535, realizava-se, em Colónia, uma convenção, que fora convocada para refutar as calúnias dirigidas pelo clero contra os franco-mações. Embora ela não tenha tido o brilho e a frequência de outras convenções, consta, embora tal afirmativa seja contestada, por carecer de comprovação, que, na ocasião, teria sido redigido um manifesto, onde era estabelecido o princípio de altos graus, que seriam introduzidos por razões políticas.

Em 1539, o rei da França, Francisco I, revogava os privilégios concedidos aos franco-mações, abolindo as guildas e demais fraternidades e regulamentando as corporações de artesãos. Em contrapartida, em 1548, era concedido, aos operários construtores, de maneira geral, o livre exercício de sua profissão, em toda a Inglaterra; um ano depois, todavia, por exigência de Londres, era cassada a autorização concedida, o que fazia com que os franco-mações ficassem na condição de operários ordinários, como tais sendo tratados legalmente. Em 1558, ao assumir o trono da Inglaterra, a rainha Isabel renovava uma ordenação de 1425, que proibia qualquer assembleia ilegal, sob pena dela ser considerada uma rebelião. Três anos depois, em Dezembro de 1561, tendo, os franco-mações ingleses, anunciado a realização de uma convenção em York, durante a festividade de São João Evangelista, Isabel ordenou a dissolução da assembleia, decretando a prisão de todos os presentes a ela; a ordem só não foi confirmada, porque lorde Thomas Sackville, adepto da arte da construção, estando presente, demoveu a rainha de seu intento, fazendo com que, em 1562, ela revogasse a ordenação de 1425.

Em 1563, a Convenção de Basileia, feita por iniciativa da confraria de Estrasburgo, organizava um código para os franco-mações alemães, o qual serviria de regra à corporação dos canteiros, até que surgissem os primeiros sindicatos de operários, no século XIX. Mas era patente o declínio das confrarias, no século XVI. A Renascença relegara o estilo gótico e a estrutura ogival das abóbadas - próprias da arte dos franco-mações medievais - ao abandono, revivendo as características da arte greco-romana. Assim, embora ela tivesse atingido a todos os campos do conhecimento e a todas as corporações profissionais, foi a dos franco-mações a mais afectada. No final do século, Ínigo Jones introduzia, na Inglaterra, o estilo renascentista, sepultando o estilo gótico e apressando a decadência das corporações de franco-mações ingleses. Estas, perdendo o seu objectivo inicial e transformando-se em sociedade de auxílio mútuo, resolveram, então, permitir a entrada de homens não ligados à arte de construir, não profissionais, que eram, então, chamados de Maçons aceitos.

Iniciava-se a transformação na Maçonaria actual
As corporações, evidentemente, começaram por admitir pessoas em pequeno número e seleccionadas entre os homens conhecidos pelos seus dotes culturais, pelo seu talento e pela sua condição aristocrática, que poderiam dar projecção a elas, submetendo-se, todavia, aos seus regulamentos. Era a tentativa de suster o declínio.

O primeiro caso conhecido de aceitação é o de John Boswell, lord de Aushinleck - ou, segundo J.G. Findel, sir Thomas Rosswell, esquire de Aushinleck - que, a 8 de Junho de 1600 foi recebido como Maçom aceito - não profissional - na Saint Mary's Chapell Lodge (Loja da Capela de Santa Maria), em Edimburgo, na Escócia. Esta Loja fora criada em 1228, para a construção da Capela de Santa Maria, destinando-se, como já foi visto, às assembleias dos obreiros e discussões sobre o andamento das obras.

Depois disso, o processo de aceitação, iniciado na Escócia, iria se espalhar e se acelerar, fazendo com que, ao final do século, o número de aceitos já ultrapassasse, largamente, o de franco-mações operativos. Os mais famosos nomes de "aceitos", na primeira metade do século XVII, foram: William Wilson, aceito em 1622; Robert Murray, tenente-general do exército escocês, recebido, em 1641, na Loja da Capela de Santa Maria e tornando-se, posteriormente, Mestre Geral de todas as Lojas do Exército; o coronel Henry Mainwairing, recebido, em 1646, numa Loja de Warrington, no Lancashire; e o antiquário e alquimista Elias Ashmole, recebido na mesma Loja e no mesmo dia (16 de Outubro) que o coronel Henry.

Em 1666, os franco-mações iriam recuperar parte do antigo prestígio, diante do grande incêndio, que, a 2 de Setembro daquele ano, aconteceu em Londres, destruindo cerca de quarenta mil casas e oitenta e seis igrejas. Nessa ocasião, os Maçons acorreram para participar do esforço de reconstrução, sob a direcção do renomado mestre arquitecto Cristopher Wren, que, em 1688, viu aprovado o seu plano para reconstrução da cidade, sendo nomeado arquitecto do rei e da cidade de Londres. A obra principal de Wren foi a reconstrução da igreja de S. Paulo, em cujo adro se desenvolveria e se estabeleceria, em 1691, uma Loja de fundamental importância para a História da Maçonaria moderna: a Loja São Paulo (em alusão à igreja), ou Loja da taberna "O Ganso e a Grelha", em alusão ao local em que, como faziam outras Lojas, realizava suas reuniões de carácter informal e administrativo, como se verá adiante. A reconstrução de Londres só iria terminar em 1710.

E nascia a primeira Grande Loja
Como, na época, não existiam templos maçónicos - o primeiro só seria inaugurado em 1776 - os Maçons reuniam-se em tabernas, ou nos adros das igrejas. As tabernas, cervejarias e hospedarias desse tempo, principalmente na Inglaterra, tinham uma função social muito grande, como local de reunião e de troca de ideias de intelectuais, artífices, obreiros do mesmo ofício, etc. . A Loja da Cervejaria "The Goose and Gridiron" (O Ganso e a Grelha), ou Loja São Paulo, inicialmente formada só pelos Maçons de ofício que participaram da reconstrução de Londres, resolvia, em 1703, diante do número cada vez maior de Maçons aceitos, em todas as Lojas, admitir, a partir dali, homens de todas as classes, sem qualquer restrição, promovendo, então, uma reforma estrutural, que iria dar o arcabouço da moderna Maçonaria. A admissão, em 1709, do reverendo Jean Théophile Désaguliers , nessa Loja, em cerimónia realizada no adro da igreja de São Paulo, iria apressar o processo de transformação, já que Désagulliers iria se tornar seu líder e paladino.

A 7 de Fevereiro de 1717, Désagulliers conseguia reunir quatro Lojas metropolitanas, para traçar planos referentes à alteração da estrutura maçónica. Nessa ocasião, foi convocada uma reunião geral dessas quatro Lojas existentes em Londres, para o dia 24 de Junho daquele ano. Essa reunião foi realizada na taberna "The Apple Tree" (A Macieira), e as Lojas presentes foram, além da "O Ganso e a Grelha": a da Cervejaria "The Crown" (A Coroa), a da Taberna "Rummer and Grappes" (O Copázio e as Uvas) e a da Taberna "The Apple Tree" (A Macieira).

E, no dia 24 de Junho de 1717, como fora marcado, as quatro Lojas reuniam-se e criavam The Premier Grand Lodge (a Primeira Grande Loja), em Londres, implantando o sistema obediencial, com Lojas subordinadas a um poder central, sob a direcção de um Grão-Mestre, já que, antes disso, as Lojas eram livres de qualquer subordinação externa, concretizando a ideia do "Maçom livre na Loja livre". Isso era, portanto, um fato novo e uma grande alteração - uma verdadeira revolução - na estrutura maçónica tradicional, o que faz com que esse acontecimento seja tomado como o divisor de águas, o marco histórico entre a antiga e a moderna Maçonaria, ou seja, entre a operativa, ou de ofício, e a dos aceitos, ou especulativa, sua forma moderna.

sábado, 8 de agosto de 2009

A Religião Natural.



Segundo Cícero, o termo religião vem do Latim re-ligare. Em sua acepção etimológica, é religião tudo o que religa o ser humano com a divindade. As definições de religião são muitas; cada filósofo propõe a sua. Em geral, a religião pode ser definida como sendo o conjunto de deveres do homem para com Deus. Ela se divide em natural e sobrenatural. A primeira determina os deveres da criatura para com o seu Criador, com o auxílio da razão. A segunda inspira-se nas luzes da fé e da revelação. Nosso propósito é tratar somente da religião natural.

O conjunto dos atos pelos quais cumprimos os nossos deveres para com Deus constitui o culto. Sendo o homem composto de alma e de corpo, destinado por natureza a viver em sociedade, conclui-se que o culto a Deus deve ser interno e externo, conforme sejam os seus atos religiosos puramente espirituais, com sua manifestação exterior, ou sejam cumpridos em nome da sociedade.

O CULTO INTERNO
O ato religioso por excelência, por ser a expressão das relações da alma com Deus, é a oração, na qual se resume todo o culto. A oração pode ser definida como a elevação da alma para Deus a fim de O adorar, render-Lhe graças e solicitar o Seu perdão e a Sua assistência.

Os deístas admitem a necessidade da oração que adora, agradece e se arrepende, mas excluem totalmente a oração que pede, alegando ser ela inútil e até injuriosa a Deus. Deus, diz Kant, é onisciente; conhece as nossas necessidades melhor do que nós mesmos. É inútil expor-Lhas por meio da oração. Deus é infinitamente bom, e infinitamente inclinado a auxiliar-nos e socorrer-nos. Assim, é supérfluo importuná-Lo com a oração. Segundo J.J. Rousseau, os decretos de Deus são imutáveis. Por isso seria presunção pretender modificá-los (Maktub – está escrito - é a expressão árabe para o determinismo).

Ora, Deus conhece sem dúvida o que nos falta. Não é para O informar que oramos. A oração é, antes de tudo, a confissão da nossa impotência e da necessidade que temos de Deus. Em si mesma, esta confissão é meritória, e por isso Deus constituiu-a a condição e o meio para nos conceder os seus favores. Dizem os deístas que Deus é infinitamente bom e não espera pelos nossos merecimentos para nos cumular de Seus dons.

É fora de dúvida que Deus tudo pode fazer por si mesmo; mas também não é menos verdade que exige a nossa participação pessoal. Não é outra a razão pela qual Ele nos dotou de inteligência, vontade e liberdade, através da quais podemos obter o merecimento. Pretender que Deus tudo fará por si mesmo equivale a negar a causalidade do ser humano. Dizer que é inútil a oração que pede alguma coisa, baseado na imutabilidade dos decretos divinos é pretender provar, não só a inutilidade da oração, mas ainda de toda a intervenção humana, levando-nos assim ao fatalismo absoluto.

Sem dúvida, os decretos de Deus são eternos e imutáveis; sabemos também que prevêem, e que abarcam tudo na existência do universo. Mas, quando uma pessoa dirige a Deus uma prece digna de ser ouvida, não devemos supor que esta oração só agora chega ao conhecimento de Deus. Ele ouviu já esta oração desde toda a eternidade; e se este Pai misericordioso a julgou digna de ser ouvida, o universo foi organizado em favor dela, de tal maneira que o seu cumprimento não foi mais do que uma seqüência do curso natural dos acontecimentos.

O CULTO EXTERNO
Não basta apenas o culto interno a Deus, por meio dos atos íntimos das faculdades da nossa alma. É necessário também exteriorizar estes sentimentos por palavras e por atitudes. A estas manifestações chamamos de culto externo.

Ainda que menos importante do que o culto interno, o culto externo não é menos obrigatório, por vários motivos, dos quais destacamos três:

- O corpo, por ser parte essencial do ser humano, tem também o dever de tributar a sua homenagem a Deus.
- A influência do moral sobre o físico é uma lei da natureza; por isso todos os atos íntimos se refletem exteriormente e se manifestam através de alguma modificação em nosso organismo.
- Esta influência – do moral sobre o físico – prova que as ações externas favorecem e desenvolvem os sentimentos internos. Daí se conclui que o culto externo é um dever, por ser uma conseqüência natural e uma condição necessária ao culto interno.

O CULTO PÚBLICO
É o culto que a sociedade tributa a Deus por intermédio dos seus representantes (da sociedade e não de Deus, que não os tem). Este culto é também obrigatório, por várias razões:

- Visto ser o homem essencialmente sociável, deve, como tal, prestar homenagem a Deus, e perante Ele proclamar a sua absoluta dependência.
- Deus é o Criador e a Providência das sociedades humanas; por isso tem direito a que as sociedades o invoquem e glorifiquem.

A religião constitui o mais sólido fundamento dos Estados, é a grande inspiradora das mais nobres virtudes, principalmente da justiça e da caridade, sem as quais não pode haver uma sociedade estável e duradoura. O profeta Maomé dizia que os homens maus eram os que não praticavam a caridade nem o culto a Allah. A sabedoria árabe nos deu este pensamento: a caridade sem a religião vale mais para a ordem do universo do que a tirania de um príncipe devoto.

O culto público é a garantia do culto externo, como este também é a garantia do culto interno. Pelo fato de se unirem para honrar a Deus, isto é, orar, os homens mutuamente se incitam a praticar a religião, e por isso ficam ao abrigo das extravagâncias e das superstições facilmente originadas do culto puramente individual. A razão estabelece a necessidade do culto individual e social, embora deixe em aberto o modo como este culto deva ser prestado.

MAÇONARIA – CULTO E RELIGIÃO
Albert Mackey, o compilador dos 25 Landmarks obedecidos na Maçonaria brasileira, assim se expressa em sua Encyclopaedia:
“A Maçonaria é uma instituição eminentemente religiosa, e deve unicamente ao elemento religioso que ela contém a sua origem e a perpetuidade de sua existência que, sem o elemento religioso, não mereceria ser cultivada por um homem sábio e bom”.

Ao contrário do que pensamos sobre os Landmarks de Mackey, concordamos totalmente com o seu pensamento sobre a religião, e afirmamos também que a Maçonaria é uma Religião. Quando falamos de Egrégora, falamos da comunhão dos sentimentos de elevação espiritual para Deus. Quando falamos de Cadeia de União, falamos também da troca de energias resultantes da comunhão dos mesmos ideais e da elevação espiritual em busca da divindade.

Os trabalhos da maçonaria regular não são iniciados nem concluídos sem a invocação ao Ser Supremo, e sem a abertura e o fechamento ritualístico do Livro da Lei, sobre o qual prestamos nossos juramentos. Tudo isto é um culto natural e público a Deus. Por isso, a Maçonaria é sumamente religiosa, respeitando o culto interno de cada um dos seus membros, qualquer que seja a religião por ele individualmente praticada. Em sua constante busca da Verdade, a Maçonaria pratica a Religião Natural, a que, à luz da razão, estabelece o conjunto dos Deveres para com Deus, sobre os quais somos questionados já na Prova da Terra da nossa Iniciação.

Dizia nosso Irmão Rui Barbosa em sua Oração aos Moços: “Oração e trabalho são os recursos mais poderosos na criação moral do homem. A oração é o íntimo sublimar-se d’alma, pelo contato com Deus. O trabalho é o inteirar, o desenvolver, o apurar das energias do corpo e do espírito, mediante a ação contínua de cada um sobre si mesmo e sobre o mundo onde labutamos. O indivíduo que trabalha acerca-se do autor de todas as coisas. Quem quer, pois, que trabalhe, está em oração ao Senhor. Oração pelos atos, que emparelha com a oração pelo culto”.

Oremos pois, meus Irmãos, pelo trabalho e pelo culto maçônico. A oração nos eleva acima e além do corpo físico, prisão temporária e perecível de nossa alma, e nos aproxima do nosso Criador, Deus, o Supremo Arquiteto do Universo.


Bibliografia
Jean Jacques Rousseau - Confissões
Emmanuel Kant – Crítica da Razão Pura
Rui Barbosa – Oração aos Moços
Mansour Challita – As mais Belas Páginas da Literatura Árabe
Encyclopaedia Británica – Volume nº 7
Nicola Aslan – Grande Diccionario de Maçonaria e Simbologia


ANTÓNIO ROCHA FADISTA
M.'.I.'., Loja Cayrú 762 GOERJ / GOB - Brasil

Huzzé



A palavra HUZZÉ tem origem hebraica, embora em árabe seja pronunciada “HUZZA”, para os antigos árabes ‘HUZZA” era o nome dado a uma espécie de acácia consagrada ao sol, como símbolo da imortalidade, e sua tradução significa força e vigor, palavras simbólicas que fazem parte da tríplice saudação feita na Cadeia de União: Saúde, Força e Vigor. Na Inglaterra a aclamação “HUZZÉ” tem a pronúncia UZEI, tomada do verbo TO HUZZA (aclamação) como sentido “viva o rei”.

Significados:

*No pequeno Vademecum Maçônico do Ir.´. Ech Lemos: “Houzé” – Grito de alegria dos maçons do rito escocês .

*No dicionário de maçonaria do Ir.´. Joaquim Gervasio de Figueiredo: Houzé – Grito de aclamação do maçon escocês.

*No dicionário maçônico do Ir.´. Rizzardo da Camino, Huzzé é apresentado como uma corruptela de HUZZA, que seria a expressão de alegria e louvor usada pelos maçons ingleses traduzida por “viva”.

*Biblicamente, HUZZÉ era o nome de uma personagem.

Pronúncia:
Deve-se pronunciar “HUZZÉ”, dando ênfase ao som da letra “H”, a qual exige um sopro mais forte, e “ZZÉ” como afirmação, como que solfejando um Dó bem longo e terminando em Fá, tendo a sensação de estar passando do escuro da noite para o alaranjado da manhã, da dúvida para a certeza, da angústia para serenidade.

Em maçonaria, HUZZÉ é uma exclamação, e como tal, deve ser clamada com um sopro forte, quase gritado, em dois sons, para que possa ser respeitada a harmonia musical do vocábulo, a fim de que se conserve todo efeito esotérico desta saudação ao GADU.´., significando que Deus é sabedoria, força e beleza. HUZZÉ, HUZZÉ, HUZZÉ, ou seja, salve o GADU.´. , salve o GADU.´. , salve o GADU.´.

O valor do HUZZE está no som, a energia provocada elimina as vibraçõesw negativas. Quando em Loja, surgirem discussões ásperas e o V.´.M.´. receiar-se que o ambiente posssa ser ‘perturbado” suspenderá os trabalhos, e comandará a expressão HUZZÉ, de forma tríplice, reiniciando os trabalhos, o ambiente será outro, ameno e harmônico.

Dentro de Loja, o V.´.M.´. comanda no início dos trabalhos a exclamação HUZZÉ, que deve ser pronunciada em uníssono. Essa exclamação prepara o ambiente espiritual, afastando os resquícios de vibrações negativas trazidas para dentro do templo pelos IIr.´.

Ao término dos trabalhos é exclamado para “aliviar” as tensões surgidas. Toda liturgia maçônica compreende os aspectos místicos, físicos e psíquicos.

O HUZZÉ que provoca a expulsão do ar impuro, substituído pelo “Prana” que se forma no Templo, harmoniza o ambiente numa escala única, num nivelsalutar, capacitando o maçon para receber em seu interior os benefícios da Loja.

Quando um maçon é solicitado a exclamação o HUZZÉ que o faça conscientemente para obter, assim, os resultados mágicos dessa manifestação física de seu organismo, portanto deve ser aprendida e ensinada, para que possas ser exercitada com Sabedoria Força e Beleza.


Bibliografia:
"Simbolismo do Primeiro Grau" – Rizzardo da Camino
Bíblia – Livros 2 – Samuel, cap. 06
"Dicionário Maçônico" - Rizzardo da Camino
"Dicionário da Maçonaria" – Joaquim Gervasio de Figueiredo


MANOEL JÚNIOR
C.'.M.'., Loja Verdadeiros Amigos - São Paulo/SP, Brasil

Os Landmarks


*** de Albert Galletin Mackey ***

I - Os processos de reconhecimento são os mais legítimos e inquestionáveis de todos os Landmarks. Não admitem mudança de qualquer espécie; desde que isso se deu, funestas conseqüências posteriores vieram demonstrar o erro cometido.

II - A divisão da Maçonaria Simbólica em três graus - Aprendiz, Companheiro e Mestre - é um Landmark que, mais que qualquer outro, tem sido preservado de alterações apesar dos esforços feitos pelo daninho espírito inovador.

III - A lenda do terceiro grau é um Landmark importante, cuja integridade tem sido respeitada. Nenhum rito existe na Maçonaria, em qualquer país ou em qualquer idioma, em que não sejam expostos os elementos essenciais dessa lenda. As fórmulas escritas podem variar, e na verdade variam; a lenda do Construtor do Templo de Salomão, porém, permanece em essência. Qualquer rito que a excluir ou a altere substancialmente, deixará de ser um Rito Maçônico.

IV - O Governo da Fraternidade por um Oficial que é seu presidente, denominado Grão-Mestre, eleito pelo povo maçônico, é o quarto Landmark da Ordem Maçônica. Muitos pensam que a eleição do Grão-Mestre se pratica por ser estabelecida em lei ou regulamento, mas nos anais da Instituição, escontram-se Grão-Mestres muito antes de existirem Grandes Lojas, e se todos os Regulamentos e Constituições fosse abolidos, sempre seria mister a existência de um Grão-Mestre.

V - A prerrogativa do Grão-Mestre de presidir todas as reuniões maçônicas, feitas onde e quando se fizerem, é o quinto Landmark. É em virtude dessa lei, de antiga usança e tradição, que o Grão-Mestre ocupa o Trono e preside todas as sessões da Grande Loja, assim como quando se ache presente à sessão de qualquer Loja subordinada à autoridade maçônica de sua obediência.

VI - A prerrogativa do Grão-Mestre de conceder licença para conferir graus em tempos anormais, é outro importantíssimo Landmark. Os estatutos e leis maçônicas exigem prazos, que devem transcorrer entre a proposta e a recepção do candidato, porém o Grão-Mestre tem o direito de dispensar esta ou qualquer exigência, e permitir a Iniciação, a Elevação ou Exaltação imediata.

VII - A prerrogativa que tem o Grão-Mestre de dar autorização para fundar e manter Lojas, é outro importante Landmark. Em virtude dele, o Grão-Mestre pode conceder a um número suficiente de Mestres-Maçons o privilégio de se eunir e conferir graus. As Lojas assim constituídas chamam-se "Lojas Licenciadas". Criadas pelo Grão-Mestre só existem enquanto ele não resolva o contrário, podendo ser dissolvidas por ato seu. Podem viver um dia, um mês ou seis. Qualquer que seja, porém, o prazo de sua existência, exclusivamente ao Grão-Mestre a deve.

VIII - A prerrogativa do Grão-Mestre de criar Maçons por sua deliberação é outro Landmark importante. O Grão-Mestre convoca em seu auxílio seis outros Mestres-Maçons, pelo menos, forma uma Loja e sem uma forma prévia confere os graus aos candidatos, findo o que, dissolve a Loja e despede os Irmãos. As Lojas asssim convocadas por este meio são chamadas "Lojas de Emergência" ou "Lojas Ocasionais".

IX - A necessidade de se congregarem os Maçons em Lojas é outro Landmark. Os Landmarks da Ordem prescrevem sempre que os Maçons deveriam congregar-se com o fim de entregar-se a tarefas operativas e que às suas reuniões fosse dado o nome de "Lojas". Antigamente, eram estas reuniões extemporâneas, convocadas para assuntos especiais e logo dissolvidas, separando-se os Irmãos para de novo se reunirem em outros pontos e em outras épocas, conforme as necessidades e as circunstâncias exigissem. Cartas Constitutivas, Regulamentos Internos, Lojas e Oficinas permanentes e contribuições anuais são inovações puramente moderna de um período relativamente recente.

X - O Governo da Fraternidade, quando congregada em Loja, por um Venerável e dois Vigilantes é um outro Landmark. Qualquer reunião de Maçons congregados sob qualquer outra direção, como, por exemplo, um presidente e dois vice-presidentes, não seria reconhecida como Loja. A presença de um Venerável e dois Vigilantes é tão essencial para a validade e legalidade de uma Loja que, no dia de sua consagração, é considerada como uma Carta Constitutiva.

XI - A necessidade de estar uma Loja a coberto, quando reunida, é outro importante Landmark que não deve ser descurado. O cargo de Guarda do Templo, que vela para que o local da reunião seja absolutamente vedado à intromissão de profanos, independe, pois, de qualquer Regulamento ou Constituição.

XII - O direito representativo de cada Irmão nas reuniões da Fraternidade, é outro Landmark. Nas reuniões gerais, outrora chamadas "Assembléias Gerais", todos os Irmãos, mesmo os Aprendizes, tinham o direito de tomar parte. Nas Grandes Lojas, hoje, só tem direito de assistência os Veneráveis e Vigilantes, na qualidade, porém, de representantes de todos os Irmãos das Lojas. Antigamente, cada Irmão se auto-representava. Hoje são representados pelas Luzes de sua Loja. Nem por motivo dessa concessão, feita em 1817, deixa de existir o direito de representação firmado por este Landmark.

XIII - O direito de recurso de cada Maçon das decisões de sua Loja para a Grande Loja, ou Assembléia Geral dos Irmãos, é um Landmark essencial para a preservação da Justiça e para previnir a opressão.

XIV - O direito de todo Maçom visitar e tomar assento em qualquer Loja é um inquestionável Landmark da Ordem. É o consagrado "Direito de Visitação", reconhecido e votado universalmente a todos os Irmãos que viajam pelo orbe terrestre. É a conseqüência do modo de encarar as Lojas como meras divisões da família maçônica.

XV - Nenhum Irmão desconhecido dos Irmãos da Loja pode a ela ter acesso como visitante sem que primeiro seja examinado, conforme os antigos costumes, e como tal reconhecido. Este exame somente pode ser dispensado se o Irmão visitante for conhecido por algum Irmão da Loja, o qual por ele será responsável.

XVI - Nenhuma Loja pode intrometer-se em assunto que diga respeito a outra, nem conferir graus a Irmãos de outros Quadros.

XVII - Todo Maçom está sujeito às leis e aos regulamentos da jurisdição maçônica em que residir, mesmo não sendo, aí, obreiro de qualquer Loja.
A inafiliação constitui, por si própria, uma falta maçônica.

XVIII - Por este Landmark, os cadidatos à Iniciação devem ser isentos de defeitos ou mutilações, livres de nascimento e maiores. Uma mulher, um aleijado ou um escravo não podem ingressar na Fraternidade.

XIX - A crença no GRANDE ARQUITETO DO UNIVERSO é um dos mais importantes Landmarks da Ordem. A negação dessa crença é impedimento absoluto e irremovível para a Iniciação.

XX - Subsidiariamente à crença em um ENTE SUPREMO, é exigida, para a Iniciação, a crença numa vida futura.

XXI - Em Loja, é indispensável a presença, no Altar, de um LIVRO DA LEI, no qual supõe-se, conforme a crença, estar contida a vontade do Grande Arquiteto do Universo. Não cuidando a Maçonaria de intervir nas peculiaridades da fé religiosa dos seus membros, o "Livro da Lei" pode variar conforme o credo. Exige, por isso, este Landmark que um "Livro da Lei" seja par indispensável das alfaias de uma Loja Maçônica.

XXII - Todos os Maçons são absolutamente iguais dentro da Loja, sem distinção de prerrogativas profanas, de privilégios que a sociedade confere.
A Maçonaria a todos nivela nas reuniões maçônicas.

XXIII - Este Landmark prescreve a conservação secreta dos conhecimentos havidos pela Iniciação, tanto os métodos de trabalho como suas lendas e tradições, que só devem ser comunicados a outros Irmãos.

XXIV - A fundação de uma ciência especulativa, segundo métodos operativos e uso do simbolismo e a explicação dos ditos métodos e dos termos neles empregados com o propósito de ensinamento moral, constitui outro Landmark.
A preservação da Lenda do Templo de Salomão é outro fundamento deste Landmark.

XXV - O último Landmark é o que afirma a inalterabilidade dos anteriores, nada lhes podendo ser acrescido ou retirado, nenhuma modificação podendo ser-lhes introduzida. Assim como de nossos antecessores os recebemos, assim os devemos transmitir aos nossos sucessores - Nolumus est leges mutari.